NINURTA E A TARTARUGA



Após ficar bem reconhecido como guerreiro e herói dos Anunnaki ao derrotar Anzu, Ninurta, que já não era muito do humilde, se tornou extremamente arrogante e soberbo. O reconhecimento que obteve fez seu ego inflar de tal maneira que ele passou a se ver como o grande e único herói dos Anunnaki, para ele a sua façanha de derrotar Anzu ainda não tinha sido recompensada a altura de tal desafio. Ele se via como o mais forte de todos, o maioral. Como dizem na linguagem popular, ele se via como a última bolacha do pacote, mas para ele era pior, na mente dele ele era a última bolacha do universo. Ninguém poderia desafiá-lo pois ninguém seria capaz de derrotá-lo. Ninguém era digno de nada a não ser ele. Todos deveriam tratá-lo como Rei do Universo, ou enfrentariam a sua fúria. O texto O Retorno de Ninurta a Nippur nos dá uma amostra do ego inflado de Ninurta:

“Entre todos eu sou o mais forte, eu sou Ninurta. Prostrem-se em meu nome. Eu sou o mais poderoso filho de Enlil, sou forte como um leão. Sou grande entre os deuses da tempestade do céu. Eu sou aquele que An, o grandioso, em sua glória escolheu”

E os elogios e bajulações feitos a ele também ajudaram no engrandecimento da imagem de Ninurta:

“Aquele que é como An, ó filho de Enlil, nascido de Nintur, tu és Ninurta, o mais poderoso entre os divinos Anunna. Tu que surgiu da cordilheira, já imbuído de terrível e grande poder. Meu soberano, tu és magnífico e forte; deixe sua grandiosidade ser elogiada. Ninurta, deixe sua magnificência ser elogiada”

Os textos elogiam bastante a força, o poder e o heroísmo de Ninurta, e sempre elogiam sua proeza da vitória sobre Anzu, e frisam seus feitos durante a batalha, como a detonação de montanhas (através de mísseis). O texto citado logo a pouco também descreve como Ninurta era um homem de braços musculosos, o que nos faz imaginar sua possível aparência como militar, forte e corpulento, com músculos definidos. Tal texto também fala como após capturar alguns animais (provavelmente para serem servidos em refeição), junto do deus Ud-ane, “o que tudo vê”, de Lugal Anbara,  o “deus barbudo” e Lugal Kurdub, o “senhor das montanhas”, Ninurta é convocado por Enlil, que provavelmente percebeu as atitudes do filho sendo prepotente com todos. Ao chegar no Ekur, Nuska (Nusku), vizir de Enlil, o encontra no pátio das aeronaves e lhe avisa que sua grandiosidade está fazendo uma sombra aos outros deuses, incluindo Enlil. Ele diz que “seu brilho cobriu o templo de Enlil como um manto”. Nusku lhe aconselha a não causar preocupações a Enlil, pois assim seu pai lhe veria com bons olhos e lhe daria bons presentes. Ninurta então ordenou que os animais capturados fossem entregues no Ekur e então adentrou a residência de Enlil. Ashimbabbar (Nannar) que estava lá naquele momento, o saudou. Ninurta então conversou um pouco com sua madrasta Ninlil, mas avisou que precisava ir logo ver seu pai. Ninurta ignorou o que Enlil provavelmente disse sobre estar se pondo acima de todos, e então fez um pronunciamento aos Anunna, falando sobre suas proezas, e descrevendo várias de suas armas de batalha e sobre como Enlil lhe presentearia com grandezas. Ao sair do Ekur, Ninurta foi parado pelo deus Ninkarnuna. O tal Anunnaki provavelmente havia notado a atenção que Ninurta dava a si mesmo e o quanto se preocupava apenas com ele mesmo, e que não apenas menosprezava os outros Anunnaki, mas ignorava até mesmo seus familiares e amigos, que tanto lhe amavam. Ninkarnuna, que pode ter sido um amigo de Ninurta ou de sua esposa, ou algum Anunnaki principal o qual não consigo identificar, percebeu que Ninurta não estava dando a devida atenção e carinho a Bau, sua esposa, aqui no texto reconhecida como Ninnibru. Ninkarnuna aconselha Ninurta a agradar a esposa e ser gentil com ela, e dizer que ele não parava de pensar nela e dizer o quanto lhe amava. Ninurta gostou bastante do conselho de Ninkarnuna, e como diz o texto, “O senhor Ninurta passou a ver Ninkarnuna com um olhar de aprovação”. Quando chegou na sua casa, o Esumesa, fez exatamente o que Ninkarnuna havia lhe aconselhado. O texto diz:

“Quando Ninurta entrou sozinho no seu amado E-su-me-sa. Logo contou a sua esposa, a jovem dama Ninnibru, tudo que estava em seu coração e em sua mente, e lhe disse agradáveis palavras”

Ninurta manteve sua boa relação com sua esposa, mas continuou a ser soberbo. Ao menos, reconhecia que tinha sido Enki que havia lhe proporcionado o destino de guerreiro, como nesse trecho:

“Eu sou o tio favorito de Inanna. Eu sou o guerreiro que Enki destinou a enfrentar temíveis desafios”

Logo após a vitória de Ninurta sobre Anzu, Ea/Enki também elogiou bem o primogênito de seu irmão, como diz o texto Ninurta e a Tartaruga:

“Que seu pai Enlil faça tudo o que você quiser. Ninmah não poderá igualar seus feitos. Ninguém será mais terrível que você, e nenhum deus estenderá as mãos diante de ti. Que sua casa possa devidamente receber os tributos do santuário. Possa An proclamar o seu nome em honra”

Mas para Ninurta não bastaram os elogios e o respeito de Enki e os presentes de Enlil, e então, algum tempo depois, exigiu de Enki alguma grandiosa recompensa por ter detido Anzu, que teria de ser a maior recompensa já dada a alguém na história, ele não estava satisfeito e acreditava que Enki tinha a obrigação de lhe oferecer algum poder. Enki apenas elogiou Ninurta e disse que Enlil faria dele o maior entre os Anunnaki e que ele (Ea) o apoiaria. Mas Ninurta não se contentou com tais promessas de Enki. Ninurta, doente por sua arrogância, como diz o texto, ficou “sombrio e amarelado”. Ninurta viu na atitude de Enki o maior desrespeito, e talvez, em sua mente arrogante e distorcida, ele pensou que Enki estava fazendo pouco dele e zombando dele de alguma forma. Se Marduk se adoentou em sua ganância na busca pelo poder supremo, não tendo nada; Ninurta se adoentou em sua arrogância por ter tudo. É a consequência extrema do mimo a uma pessoa que já tem tendências de arrogância e soberba: Ter tudo nas mãos, e nunca estar satisfeito, e sempre querer mais e mais. Todos os principais Anunnaki, ou pelo menos a maioria, pois há exceções, eram de certa forma um pouco arrogantes, pois eram todos príncipes, membros da realeza, e por terem muito mais privilégios do que outros Anunna, eram ainda muito mimados desde pequenos, tendo tudo que desejavam, e por isso cresciam com vontade de sempre obter mais e mais, pois assim desejavam, e assim achavam que podiam ter tudo. É só imaginarmos facilmente como seria a mente de alguém nascido príncipe ou princesa, membro de uma poderosa família da realeza, sendo mimado, ganhando tudo que quer, crescendo tendo pra si inúmeros privilégios, sendo bajulado e engrandecido pelo sangue real que percorre suas veias. Se a pessoa deixar se levar por tudo isso, é fácil imaginar o adulto soberbo e arrogante que tal pessoa se tornaria. Devemos levar em consideração também que o poder dos príncipes em Nibiru provavelmente é muito mais podado no palácio do Rei Supremo, mas na Terra, os príncipes perdiam a noção da submissão ao poder de Anu, o Líder Supremo, e tomavam pra si mesmos a liberdade de fazer toda a bagunça que fizerem em nosso mundo, entre eles e para conosco. Anu sempre quis a paz acima de tudo, tanto que para evitar um conflito entre seus dois filhos principais, se predispôs a ceder o trono a qualquer um dos dois, mas infelizmente, como sabemos, uma guerra inevitavelmente aconteceu envolvendo Kumarbi e os Igigi, talvez, porquê era o destino, talvez devesse ter acontecido alguma guerra naquele momento, quem sabe. Não demorou muito para que outro conflito surgisse, dessa vez com Anzu, mas novamente envolvendo os Igigi. Numa visão mais ampla, nós podemos ver como alguns Nibiruanos aproveitaram de sua posição na colonização de um novo mundo, para tentar obter o controle sobre a Terra. Eles viram ali a oportunidade de eles mesmos se tornarem um “Líder Supremo”. Se não poderiam sê-lo em Nibiru, seriam na Terra. Viram ali a oportunidade de criar um poder paralelo ao poder de Anu. Uma colônia que evoluiria para uma nova casa permanente para Nibiruanos, se estabeleceria um novo governo independente e eles queriam tomar a frente como Líderes nesse processo. Felizmente isso não aconteceu, mas os Anunnaki, os príncipes que nasceram aqui na Terra, a maioria deles, como dito, arrogantes, iriam a todo custo desejar mais e mais domínios e poderes na Terra, e iriam guerrear entre si, irmãos se digladiariam, tudo isso pois, não conheceram limites, não tiveram a poda imposta sobre eles através do poder de Anu, e Enlil, o nomeado Líder Supremo da Terra, não conseguiu ele mesmo impor sua supremacia com toda a força sobre os Anunnaki, e por esse motivo, as consequências foram grandes.

Enfim, Ninurta foi um desses príncipes arrogantes, e vendo que Enki não lhe daria nada do que ele desejaria, expressou uma reação de ódio e ao mesmo tempo menosprezo. Ninurta não falou nada naquele momento, mas em sua mente deturpada, desejava acabar com a vida de Enki. Ninurta então simplesmente dirigiu seus passos em direção a saída do palácio de Ea. Mas Enki havia notado a expressão de Ninurta e rapidamente com seu raciocínio compreendeu tudo, entendeu a mente de Ninurta e que sua arrogância estava lhe transformando num verdadeiro psicopata, e entendeu que certamente Ninurta tentaria se vingar de alguma forma, e que muito provavelmente tentaria lhe matar. Já se antecipando, Enki ordenou que as saídas/entradas de sua casa fossem todas trancadas e enviou seu vizir Isimud para correr e barrar Ninurta para que não pudesse escapar. Ninurta não entendeu bem o porquê Isimud estava tentando barrá-lo e zangado, o agrediu. Enki, que já havia preparado uma armadilha, foi ao encontro de Ninurta e disse que lhe acompanharia até os portões do Abzu. Enki foi conversando com ele disfarçadamente até a entrada, onde havia colocado um robô que se assemelhava a uma tartaruga. Quando chegaram lá, Enki fingiu estar espantado questionando o que seria aquilo, mas logo em seguida se distanciou e trancou Ninurta. A tartaruga robótica agarrou Ninurta pelos pés e o derrubou, e então escavou no chão até formar um grande buraco, no qual caiu junto com Ninurta. Enki conseguiu a façanha de derrubar Ninurta, de derrubar aquele que tanto dizia ser implacável e tudo o mais. Depois, Enki foi até perto do buraco e olhando para Ninurta, disse:

“Você voltou sua mente para me matar, você que já fez grandes reivindicações; eu o rebaixo. Eu percebi sua intenção. E veja agora como sua posição é fraca ! Onde está a sua força ? Onde está o seu heroísmo ?”

Ninurta ficou muito furioso, pois havia sido humilhado e Enki estava furioso por saber que Ninurta planejava matá-lo. E como bem Enki disse, onde estava sua força e heroísmo ao enfrentar a Tartaruga robótica ? Enki fez questão de dizer o quão Ninurta era fraco, e deve ter aproveitado o momento para descarregar o que todos já queriam dizer mas não diziam, que ele era arrogante e soberbo, que fazia muito de si e pouco de todos, mas que na verdade não passava de um homem mimado pelo pai e exageradamente bajulado. Se não fosse pela ajuda de Enki na Guerra dos Igigi, quem garante que Ninurta e Ishkur teriam derrotado Kumarbi? E se não fosse pelo segredo compartilhado a Ninurta para usar em sua aeronave, quem garante que Ninurta teria saído vivo da batalha contra Anzu? Ninurta poderia ser forte em qualquer lugar, mas diante de Enki no Abzu, ele não passava de uma criança mimada. Como mesmo Enki diz no texto:

“Você causou destruição na Grande Montanha, mas aqui como se livrará ?”

Como Ninurta escaparia do tal buraco e como se livraria do poder de Enki em seu domínio ? Não havia como Ninurta sair daquele buraco, e ali ele ficou e talvez depois de tanto tentar sair e berrar, se encolheu no canto, com medo, e chorou, pois sabia que este seria o seu fim. Ele morreria num buraco frio e escuro, encarando o maldito robô que causou a sua desgraça. Não havia forma mais humilhante de morrer para ele. O grande guerreiro morreria não numa batalha honrada, mas num buraco. De alguma forma Ninmah soube da situação, talvez alguém do Abzu quis lhe informar ou o próprio Enki fez questão de anunciar que Ninurta morreria no Abzu. Ninmah se apressou e foi até o Abzu, e correu para ver seu filho, que estava lacrimejando, com medo. Ninmah então foi falar com Enki para convencê-lo a poupar a vida de Ninurta. Ela provavelmente fê-lo entender que Ninurta já havia aprendido a lição e até disse que ele já estava chorando e que o “homem está tremendo de medo”. Ninmah ainda perguntou o que ela poderia oferecer a Enki para que ele poupasse a vida do filho dela, mas Enki estava decidido, pois ele sabia que Ninurta havia se tornado um psicopata, e que ele seria um risco não só a sua vida, mas de qualquer outro Nibiruano. Ninmah então disse que Enki estava demonstrando que não possuía sentimentos, que não chora, não perdoa, que não é misericordioso, dizendo: 

“Seu nome não pode ser Enki, seu nome é Ugugu-que não chora; pois está matando sem misericórdia”

Ninmah implorou pela vida do filho e disse que faria tudo para que ele não fosse morto. E ainda lembrou que ela já havia no passado salvado a vida de Enki (do veneno que ela mesmo implantou nele, mas tudo bem), e que então agora ela pedia que ele salvasse a vida de Ninurta:

“E como eu já salvei sua vida, salve agora a vida de meu filho !”

O texto termina aqui, incompleto, mas sabemos que Ninurta está vivo ainda nos dias de hoje, então é claro que com isso Ninmah conseguiu convencer Ea, que tirou Ninurta do buraco e poupou sua vida. Ninurta deve ter saído de lá a ponta pés, mas saiu vivo. Ninurta não revidou ao se recuperar, a humilhação pela qual tinha passado ele queria esquecer, então decidiu não colocar mais lenha na fogueira, como se diz. Ele simplesmente deixou quieto e não tocou mais no assunto. Preferiu fingir que aquilo nunca havia acontecido. É provável que nem tenha pedido desculpas a Enki, e continuou a engrandecer a si mesmo, mas não mais desrespeitava os outros Anunnaki como antes.
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